quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

10 por hora.

Claro que já se falou o suficiente sobre o trânsito de São Paulo. E sobre o trânsito combinado às chuvas de início de ano, mais ainda. Mas estando aqui, rodeada em uma maré de carros, sem trocar a marcha há mais de uma hora, como falar de outro assunto?
O trânsito é cruel, mas tem seu lado engraçado. É engraçado ver pessoas jovens ou velhas, brancas ou negras, inteligentes ou estúpidas, ricas ou pobres ficarem absolutamente presas no mesmo espaço. Uma ao lado da outra, com menos de 2 metros de distância. E mais engraçado ainda é que quase todas, apesar das diferenças, reagem do mesmo jeito: colocam a cabeça para fora, gesticulam, dão farol alto, batem a mão no volante, xingam aos céus, formam um furacão de bufadas e suspiros e claro, buzinam. Eternamente. Algumas chegam a sair do carro, injustiçadas, e logo voltam para ele, desconsoladas.
É preciso no mínimo uma década de treino prático e intensivo para ver graça nisso tudo. E, ainda assim, é uma habilidade tão particular que deveria ser destaque em qualquer currículo: “15 anos dirigindo no trânsito de São Paulo. Capacidade única de rir do congestionamento – e de si mesmo”.
Trânsito é vida. Não tenho a menor dúvida de que tudo o que eu já vi de mais bizarro aconteceu em meios aos carros, fumaça e ronco de motores. De casais se matando a casais matando qualquer tipo de pudor em público. De gente tirando caca do nariz a gente sem nariz. De pessoas se matando de rir a querendo se matar de tédio. Ou matar alguém de raiva. Gente gritando, chorando, gargalhando, cantando, surtando, competindo, comendo, sonhando, lendo, escrevendo, explodindo, espreguiçando.
A vida no trânsito é praticamente uma vida paralela e nela passamos cada vez mais tempo. Suspeito que um dia vamos inverter as bolas de vez: a vida paralela vai acontecer em casa, no trabalho, na escola; e a vida oficial vai ser a do trânsito. Quem sabe assim tudo fica mais claro e começamos a ter paz. Ou não, porque o gritar, o xingar, o competir e o ameaçar vão acontecer em outro lugar: em casa, no trabalho, na escola. Mas já não é assim? Fiquei confusa.

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