sexta-feira, 1 de agosto de 2008

Amor, tempo e doces.

Sei que, com o tempo, entendo mais sobre algumas coisas. Outras, simplesmente desisto de entender. E outras, poucas, ficam no limbo, na zona mais desconfortável, lutando por algum sentido na minha cabeça. E uma delas definitivamente é a velhice.
Só consigo entender a vida de 2 jeitos: pelo momento presente ou pela expectativa do futuro. Mas o que fazer quando a primeira alternativa pesa, cansa, machuca demais e a segunda simplesmente não é mais opção? Não vejo sentido. Sem revolta, sem medo, simplesmente não enxergo o sentido. Viver com as lembranças do que já aconteceu, mas sem a ansiedade do que vai acontecer: vou ter filhos? Netos? Mudar de país? De sexo? Os tempos verbais se invertem e sobram os “fiz”, “fui”, “conheci”, “vivi”.
Minha vó, como tantas outras, vive repetindo que está cansada de viver. Nunca respondo, tento não dar bola, mas no fundo torço para ser verdade. Que seja uma vontade dela. Que um dia a gente se canse mesmo da idéia de viver e possa dizer: pronto, estou satisfeito. Como uma jibóia fazendo a digestão.
Minha vó, quando fala, olha para o alto, como se o movimento ajudasse a lembrar o passado. Depois se perde nos pensamentos, ri, se emociona, balança a cabeça e volta para a realidade. Sabe que o tempo passou e não parece nem um pouco surpresa com isso.
Sempre que visito minha vó, saio esquisita por não sentir o que ela sente e não saber como conversar. Não me sinto à vontade para contar meus planos sabendo que ela não pode contar os dela. Dou meu carinho, meus abraços apertados, meus favores, um texto como esse (que ela não lê, porque não sabe), mas nem 10% de toda a minha atenção. Porque não sei como dar, e gostaria. De saber o que dizer, de mostrar que eu me importo sem parecer que tenho pena. No fim, abraço com medo de que amor demais mais machuque do que conforte. Mas como é tudo que tenho, é tudo que dou.
Não queria um final triste para essas palavras. Então lembrei que minha vó, quando ri, sacode os ombros. Que quando levo doce, ela esconde no armário e come escondido. Que quando fala no telefone, ela sempre termina do mesmo jeito: “Tuuuuudo de bom para você, Karina”.
São lembranças. No fim, eu também sei viver de lembranças.