Existe uma linha muito fininha que separa o “se acomodar” do “não se incomodar”. “Se acomodar” é deixar como está por falta de interesse ou de disposição para mudar. “Não se incomodar” é estratégico: é relevar o que não se pode mudar ou ignorar quando é o melhor que se pode fazer – mas mantendo em mente que o que não agrada é passageiro.
Aprendi isso com uma garçonete filipina, enquanto morei em outro canto. A vida delas não é lá essas coisas mesmo. Longe da família por muito tempo, ganhando muito pouco, recebendo ordens mal-educadas, aguentando desaforo, sendo tratadas como inferiores por uma cultura machista e preconceituosa, para quem só servem as pernas compridas na saia curta do uniforme – e olha lá. Em todo canto, se ouve a voz doce e prestativa: “Yes, sir”, “Ok, ma’am”. E os saltos desengonçados se afastando, apressados.
Quando eu conversava com uma delas, cuidava para não deixar escapar um tom de dó. Exagerava na simpatia para forçar um bate-papo de igual para igual, mas desconfiava que o efeito era contrário: evidenciava nossas diferenças.
Todo almoço sempre foi essa aflição. Até que veio a Linda: uma garçonete filipina que não fazia idéia do significado do seu nome em português e que, quando eu contei, deixou escapar pela primeira vez um sorriso tímido no meio daquele rosto redondo.
Quando eu dizia “Oi, tudo bem?” para a Linda, não queria que ela respondesse – ou pelo menos não de verdade. Mas aquele dia, ela respondeu: “Tudo bem sim. Já que ficar triste não muda nada mesmo, decidi que a partir de agora vou ser feliz. O que você vai pedir hoje?”
Aquilo não soou como piada, era mesmo uma resolução. Quanto tempo teria levado até que ela pudesse acontecer assim, no meio da anotação de um pedido de almoço? Mas aconteceu. E porque a Linda decidiu ser feliz, eu decidi me lembrar sempre dela.
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